Viver com um TDAH

Viver com um TDAH

Será que amar uma pessoa é o suficiente para entender, aceitar e tolerar os desabores que é viver com um TDAH?

Lidar com seus atrasos, seus esquecimentos, sua intolerância, seus devaneios, seus rompantes de alteração de humor, seus descasos, falta de atenção aos detalhes da relação, falta de romantismo, …?

Se a pessoa que convive com um TDAH não tiver informação adequada sobre os sintomas característicos do transtorno, e pensar que estas reações são direcionadas a ela e ao seu relacionamento, realmente pode ser muito difícil lidar com seu parceiro.

Pensando assim pode-se entender porque muitos portadores do transtorno apresentam muitas dificuldades em manter um relacionamento estável e duradouro, ou mantém relacionamentos extremamente conflitantes, com frequentes possibilidades de separação, mesmo que ainda exista amor.

Será que os TDAHs estão em constante busca por novidade e por isto não conseguem investir na relação e superar as dificuldades do cotidiano e da rotina que uma relação duradoura oferece? Ou será que é o parceiro quem acaba não tolerando as constantes alterações e oscilações de humor de seu amor, apesar do forte sentimento que ainda nutre por ele e acaba desistindo da relação?

Existem muitas perguntas sem respostas neste caso e muitas questões em aberto a respeito deste assunto. E todas estas alternativas, dentre tantas outras, podem ser verdadeiras.

É mesmo muito difícil lidar com uma pessoa com tantos sintomas, principalmente quando não se sabe que eles acontecem devido ao TDAH. Seus sintomas acabam irritando as pessoas que com ele (a) convive e a tendência é esta pessoa  acreditar que é puro descaso, falta de amor, falta de respeito e consideração.

Uma das  características resultantes da desatenção e da impulsividade que muito interfere no relacionamento de casal é a dificuldade em ouvir o que o outro fala, ou porque está muito ocupado ou porque está  distraído em seus devaneios e ruminações de pensamentos recorrentes, o que o leva a  interromper constantemente o parceiro (a) quando este fala, sem deixá-lo terminar seu raciocínio. Isto muitas vezes acontece porque a pessoa tem receio de esquecer o que vai falar, ou não entende o que a outra pessoa está dizendo e  acaba dizendo alguma coisa que não tem nada haver com a conversa, porque está pensando em outra coisa, ou porque  já entendeu, ou acha que já atendeu o que a pessoa quer dizer e não quer perder sua linha de raciocínio, então, interrompe.

Geralmente pensa rápido demais e sua fala não o acompanha, muitas vezes pode parecer desconectado com o mundo exterior,… Enfim, vários motivos e justificativas existem, que geralmente tem muito mais relação com a própria pessoa e com suas dificuldades internas do que com  contra a pessoa com quem se relaciona, mas sua maneira muitas vezes sem coerência de reagir leva aos desentendimentos, aos longos desacordos e chateações, que vão desgastando a relação.

Muitas vezes ele parece nem mesmo entender o que ele (a)pode ter feito para causar tamanha tristeza ao outro.

O fato é que quando o portador é diagnosticado e seu parceiro tem ciência deste fato, quando os sintomas são reconhecidos pelos dois, a situação pode ser amenizada, compreendida e quem sabe até compartilhada, para uma possível mudança no futuro.

Assim, a mudança pode acontecer  também na área do relacionamento conjugal, que geralmente é uma  queixa muito constante. Existe uma tendência natural do parceiro do portador de TDAH relacionar sua maneira de agir, as características do seu parceiro (a) com sua insatisfação com seu relacionamento, descaso, falta de respeito, falta de amor. Levar para o lado pessoal, sem saber que muitas das vezes ele nem sabe que fez algo errado, nem identifica o que pode ter causado a tristeza do outro. Já que efetivamente, na maioria das vezes não foi intencional.

Contudo, quando ele (a) conhece os sintomas e as dificuldades comportamentais, emocionais e executivas de seu parceiro (a), esta sensação pode ser diluída e as dificuldades que acontecem na relação começam a fazer sentido, e este pode ser o primeiro passo para a mudança e parceria no sentido de buscar ajuda profissional especializada.

Quando um cliente TDAH adulto relata ao seu terapeuta as dificuldades que vivencia em suas relações amorosas e o quanto é para ele complicado manter uma relação tranquila e estável devido aos seus sintomas, caso esteja mantendo uma relação estável no momento, sugerir que ele (a) faça algumas sessões de casal,  pode ser uma postura assertiva de seu terapeuta, e poderá facilitar um maior investimento do cliente em seu processo de mudança e com a ajuda atuante da outra parte interessada no assunto.

Conhecer os sintomas do TDAH e como eles interferem no cotidiano de um portador e conseqüentemente em suas vidas, em seus relacionamentos interpessoais, como isto pode ser minimizado com o tratamento, e a importância do crédito do parceiro (a)  para seu investimento e envolvimento contínuo e muitas vezes doloroso, é um fator  facilitador durante o tratamento.

Quando a pessoa percebe que as dificuldades de seu amor o fazem sofrer, que suas ações não são premeditadas, que não são indisposição em relação a ela e que ela inclusive pode ajudá-la, a tolerância do (a) parceiro (a) tende a aumentar e as ações cotidianas de ambos também, e estas podem inclusive  ser orientadas pelo terapeuta.

O objetivo deste esclarecimento na Psicoterapia, onde ambos podem falar o que sentem, o que não gostam no outro, o que está interferindo de forma negativa em suas vidas, mas também podem falar sobre os pontos positivos da relação, não é tornar a relação permissiva e sem limites, mas sim fazer com que os dois percebam que depois da conscientização vem a tomada de decisão em direção a mudança, para ficar mais atento às dificuldades, para saber que existem perdas para as duas partes e como cada um pode se comportar para administrar este processo e ajudar o outro, e como resultado melhorar a qualidade do relacionamento.

Esta parceria pode facilitar a conquista da mudança de hábitos e comportamentos. Naturalmente que isto só acontece com a permissão do cliente. Ele pode não querer se expor, pode não querer que seu (a) parceiro (a) saiba que ele tem TDAH e por isto mesmo não querer sua presença em seu setting terapeutico, e ele tem direito a esta escolha. Assim como ainda existem preconceitos das pessoas em relação ao portador, o próprio também tem seus preconceitos. A rejeição já é conhecida sua e ele fará o que puder para evitá-la.

A rigor, quando a parceria acontece, ambos entendem que podem ter resultados positivos, que as dificuldades poderão ser minimizadas e o lado bom de cada um ser pode ser valorizado. Afinal, não existem apenas características negativas num TDAH, e quando as dificuldades são minimizadas as características positivas sobressaem.

Carisma, irreverência e criatividade podem ser estimulantes numa relação e estes são alguns dos maiores valores de um TDAH.

Em caso de reprodução favor mencionar autor e fonte.

Nazareth Ribeiro
Psicoterapeuta Psicossomaticista Especialista em Clínica e Educação.
Coaching Vocacional e Orientação Profissional.
Coaching TDAH.
Professora da FGV (Fundação Getúlio Vargas)
Doutoranda pela ESC Rennes ( França)

4 comentários

  1. suterland(tdah) em 7 de setembro de 2010 às 14:16

    adorei, continue, pois pessoas como eu precisam do maximo de seres humanos normais e especiais como vc para nos orientar, DEUS TE ABENÇOE.



    • admin em 13 de setembro de 2010 às 15:57

      Fico feliz em ajudar,
      Espero sempre poder colaborar, então volte sempre!
      Beijo,
      Nazareth



  2. Ellen em 13 de maio de 2010 às 14:41

    Adorei…leio muitas matérias com explicações e definições sobre o transtorno ou até mesmo ajuda para o portador, mas esquecem que muitas pessoas precisam de conteúdos e instruções para viver com um TDAH.



  3. Daniela Saad em 20 de abril de 2009 às 17:58

    nossa, que matéria interessante!!